10/01/2008

Olhos nos olhos

Joana - Sou casada. Espero que não ache que estou fora de moda.
Jorge - Ora essa. Tenho o maior respeito por um casamento feliz. Foi por isso que me divorciei.
Joana – Casamento feliz é uma expressão forte, tem um peso enorme. O que entende por casamento feliz?
Jorge - Desculpe, que idade tem?
Joana – ... Um cavalheiro, está visto...
Jorge – Por favor, não me diga que ainda espera dos homens atenções machistas... que não abordem a sua idade, que lhe abram a porta do carro e que lhe puxem a cadeira nos restaurantes?
Joana – Não está a confundir machismo com boa educação?
Jorge – Acho que não, mas também sei funcionar nesse registo. Seja qual for a sua idade, parece mais nova.
Joana – Obrigada. Tenho quarenta.
Jorge – Eu não dizia? Qual é o segredo? Ginásio, alimentação saudável ou consciência tranquila?
Joana – Acha possível chegar aos quarenta com a consciência tranquila?
Jorge – Possível talvez, uma seca com certeza! Mas não quero fugir à pergunta. Para mim um casamento feliz é não permitir que a rotina do dia-a-dia se instale.
Joana – Pfff... não admira que se tenha divorciado. Um casamento desses pura e simplesmente não existe!
Jorge – Então diga-me o que é para si um casamento feliz?
Joana – Feri o seu orgulho machista? Desculpe, não o fiz de propósito. Podemos substituir o feliz? Prefiro falar em casamento estável.
Jorge – Estável? Parece que estamos a falar de uma empresa.
Joana – Quase. Não é uma empresa, é um contrato.
Jorge – Bolas, isso parece um casamento pré-revolução industrial.
Joana – Não. É a descrição de um casamento depois de a paixão morrer. Ou acha que ela resiste aos anos?
Jorge – Não... mas pensei que se transformava noutros sentimentos. Não em duas assinaturas reconhecidas pelo notário.
Joana – Não exagere o meu exagero. Claro que existem laços e fortes. Mas chamar a isso felicidade... Vive-se a nostalgia do que se passou, é deprimente e claustrofóbico.
Jorge –Você consegue?
Joana – Eu? Nem morta!
Jorge – Então desisto! Faça-me um desenho. Não percebo nada!
Joana – E porque não? Nunca mais o vejo. Vou promovê-lo a desconhecido íntimo e contar-lhe. Mas atenção! Isto não lhe dá qualquer direito: ouve, cala-se e vai-se embora. É pegar ou largar.

Olhos nos olhos
JMV
(pequena adaptação)

7 comentários:

PavlovDoorman disse...

Resumindo e concluindo uma mulher um pouco desgostosa/conformada e um homem, que ainda tendo boas ideias, mal educado.

Cereja disse...

Acha que ela está conformada? Não me parece nada. Mesmo nada.
Pode ser que qualquer dia conte o desfecho da história.

PavlovDoorman disse...

Foi essa a ideia com que fiquei...
Apesar de demonstrar vontade de progredir.

Cereja disse...

Acho que ela está num ponto de viragem... ou de auto-conhecimento.

PavlovDoorman disse...

Isso concordo...

Mandarina disse...

ora, ora, ora...
adoro chegar aqui e ver que o blog está vivo! que está cá gente!:)
é como chegar a casa e encontrar toda a gente feliz!
sabes o que te digo, girl...
não acho muita piada ao JMV! acho que não soube lidar da melhor maneira com a exposição...acontece!
...e quanto a esses 2...o que deviam fazer era enrolarem-se e no final fumar um grande cigarro!!...mas ela não podia mesmo lá voltar! ele sabe de mais...e é mais esperto que ela!:)

Cereja disse...

Ora viva D. Mary!!
Agora que eu estou de partida, passo-te o testemunho para que o mantenhas habitado :)

Eu também não lhe acho particular graça... mas gosto do desfecho deste diálogo... só que não o pus aqui... talvez um dia.
Mas não me parece que eles se enrolem.