Diário de uma caixa de hipermercado

O Natal é sempre altura de mais trabalho. Já não fechamos aos domingos à tarde. Há mais pessoas nas compras. É agora que se compra tudo - desde o mais disparatado enfeite de Natal à cueca azul-cueca para a Passagem de Ano. Mas este ano, estou ausente de tudo. Estou muito infeliz e não sei o que fazer.

O Ruben veio trabalhar para a secção de reposição e só reparei nele quando a Débora Júlia nos apresentou. Eles são namorados e já compraram um T0 na Bobadela para quando casarem...
Não censuro o Ruben... afinal a Debbie, como nós na linha de caixas a chamamos, é linda. Tem umas unhas de gel com as pontas perfeitamente quadradas, as madeixas de tons mesclados de louro e ruivo tão na moda e os tops justos da Bershka assentam-lhe todos bem! Já para não falar da sua inteligência... lê sempre o 24 Horas e acaba todas as frases com um «prontos».

Mas o que hei-de fazer? Apaixonei-me pelo Ruben. Pelo seu jeito meio desengonçado de andar. Quando ele passa pela saída dos funcionários com o carro tunning a ouvir kizomba em altos berros fico doida. Até lhe acho piada ao acne e ao boné da Von Dutch com a pála para trás.

Mas a Debbie é minha amiga. E eu não consigo deixar de pensar no Ruben. Já escrevi em todas as portas das casas de banho do centro: Eu + Ruben = Amor. Estou tão desesperada que já pensei aceitar o pedido de namoro do Bruno Wanderley. Os meus princípios não me deixam seguir em frente e conquistar o Ruben, porque temo ferir a Debbie. E assim passo os dias pensativa. Gostava de saber o que fazer, mas não me atrevo a contar a ninguém. Nós, as caixas de hipermercado, somos muito unidas e sabe Deus o que me aconteceria se isto se soubesse.

Se ao menos não fosse Natal...